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PSG NA MÍDIA

14 de janeiro de 2022

Regular cobrança de IPTU: carnê ou edital?

A intimação da cobrança do IPTU por edital, realizada por muitas prefeituras, notadamente a de São Paulo, é indevida e deve ser combatida

 

Por Marcelo Guaritá e Eduardo R. Viçoso

 

14/01/2022

 

O texto constitucional bem definiu a aptidão dos municípios para regularmente instituir o IPTU cobrado sobre a propriedade predial e territorial situada em seu perímetro, podendo, ainda, ter o seu valor impactado em razão da avaliação do bem, da sua localização e tipo de uso.

 

Vale lembrar que no caso do referido imposto, a cobrança ocorre por lançamento de ofício, isto é, quando compete ao ente político tributante a prática de todos os procedimentos necessários à apuração e notificação do sujeito passivo. Ou seja, é dever das prefeituras país afora a cobrança mediante o envio do velho e conhecido carnê do IPTU, encaminhado anualmente a todos os contribuintes geralmente no endereço dos imóveis objetos da tributação.

 

A intimação da cobrança do IPTU por edital, realizada por muitas prefeituras, é indevida e deve ser combatida

 

No âmbito do município de São Paulo, o maior do país, a regra acima está delimitada na Lei n° 14.107/05 que, em seu artigo 10, parágrafos 1º e 8º, expressamente indica o procedimento consistente na entrega do carnê no endereço do imóvel para fins de notificação do sujeito passivo do IPTU. A previsão encontra também guarida na Consolidação das Leis Tributárias da cidade, conforme prescrição contida no artigo 624, parágrafo 8º, do Anexo Único do Decreto nº 59.579/2020.

 

Subsidiariamente, na forma do indicado parágrafo 8º, a municipalidade paulistana, “na impossibilidade de entrega da notificação”, “ou no caso de recusa de seu recebimento”, resguarda-se ao justo direito de proceder à notificação do sujeito passivo através de edital. Noutras palavras, a legislação tributária paulistana não deixa qualquer margem para interpretação de que a utilização do edital é restrita, ultima ratio, comportando aplicabilidade, portanto, somente quando inexitosa a entrega do carnê.

 

Inobstante a clareza e firmeza dos comandos normativos, a administração tributária paulistana tem, na prática, abusado no emprego do edital, como se regular meio fosse para a notificação do sujeito passivo em substituição indistinta do carnê. Essa foi a orientação, em que pese a divergência, prevalente no âmbito das Câmaras Reunidas do Conselho Municipal de Tributos (CMT-PMSP) ao apreciar e julgar o Recurso de Revisão nº 6017.2019/0039389-0.

 

Prevaleceu no âmbito do aludido tribunal administrativo a apertada orientação no sentido de que o volume de emissão justificaria o uso, indevido, diga-se de passagem, do edital, ainda que ausente qualquer prévia tentativa de envio do carnê no endereço do contribuinte. Para a maioria dos julgadores, com supedâneo no artigo 12, parágrafo 2º da Lei nº14.107/05 estaria o uso irrestrito do edital autorizado pela singela justificativa de volume de trabalho. Outra, contudo, com a devida licença, nos parece ser a orientação que se extrai da leitura dos dispositivos legais sob análise.

 

Ademais, sem a intenção de se alongar, não se pode olvidar que o artigo 10, parágrafo 8º, da Lei nº 14.107/05 aduz que o uso do edital deve estar disposto em regulamento. É dizer, na hipótese de ausência de regulamento, como é o caso, o emprego do edital, por si só, é ilegítimo por ausência de previsão legal regulamentadora.

 

Outrossim, o artigo 12 do mesmo códex dispõe acerca da intimação do contribuinte na hipótese de lavratura de auto de infração, ou seja, procedimento que não se confunde com a cobrança do IPTU. É tema, portanto, diverso e, por consequência, inaplicável.

 

A jurisprudência, como não poderia deixar de ser, limita a utilização dos editais a situações excepcionais. A situação se agrava porque, não raro, a administração tem promovido lançamentos complementares relativos a exercícios passados pela via do edital, causando grande surpresa e espanto aos contribuintes que, muitas vezes, somente descobrem o problema com a citação da execução fiscal.

 

Desse modo, é de se defender que a intimação da cobrança do IPTU por edital realizada por muitas prefeituras, notadamente a de São Paulo, quando não há tentativa prévia de notificação no endereço cadastrado, é indevida, deve ser combatida e encontra guarida na jurisprudência.

 

A Prefeitura de São Paulo, aliás, já disponibilizou em seu endereço eletrônico as orientações, incluindo o calendário de entrega das notificações, para o IPTU, exercício de 2022, com a expressa e inadequada informação de que na ausência da comunicação “o contribuinte será considerado notificado”.

 

Fica, portanto, o alerta para que os contribuintes, especialmente na cidade de São Paulo, confirmem o recebimento da notificação de lançamento do imposto, isto é, do carnê no endereço do imóvel contendo o cálculo pormenorizado do valor cobrado, incluindo a área tributável, seu padrão, obsolescência, avaliação, além de eventuais acréscimos ou descontos imputados pelas prefeituras.

 

Na hipótese de discordância, seja pela ausência de recebimento do carnê, ou também porque o cálculo apresentado difere da realidade do imóvel, não se pode olvidar o inafastável direito dos contribuintes de questionar a cobrança no âmbito administrativo, mediante a apresentação de defesa para a própria prefeitura competente pela cobrança. Em São Paulo, o prazo de defesa é de 90 dias corridos, contados do vencimento da primeira parcela (ou parcela única), que ocorre durante o mês de fevereiro.

 

Marcelo Guaritá e Eduardo R. Viçoso são sócios do Peluso, Stupp e Guaritá Advogados.

 

 

https://valor.globo.com/legislacao/coluna/regular-cobranca-de-iptu-carne-ou-edital.ghtml