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STJ nega pedido de indenização de R$ 100 mil contra Haddad e PT por uso de música de Paula Toller
Cantora alegou uso indevido da música “Pintura Íntima” na campanha de 2018
Por Marcela Villar, Valor — São Paulo
(Foto: Divulgação)
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afastou, por unanimidade, a indenização de R$ 100 mil por danos morais que o Partido dos Trabalhadores (PT) e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teriam de pagar à cantora Paula Toller, ex-vocalista da banda Kid Abelha. A artista processa o ministro e o partido por uso indevido de sua imagem e da música “Pintura Íntima” durante a campanha presidencial de 2018, quando Haddad era candidato à Presidência.
Enquanto a cantora afirma não ter autorizado o uso da composição “amor com jeito de virada”, o PT e o atual ministro da Fazenda afirmam que não poderiam ser responsabilizados por um vídeo produzido por terceiros que circulou nas redes sociais. As decisões na 1ª a 2ª instâncias foram favoráveis à Paula Toller, fixando danos morais de R$ 100 mil, além dos danos materiais – estes seriam apurados na fase de liquidação de sentença, mas seria equivalente a 20 vezes o valor do licenciamento cobrado pela cantora com a exposição.
No STJ, o cenário se inverteu. O ministro relator do caso, Marco Aurélio Bellizze, reformou as decisões anteriores para acatar integralmente o recurso de Haddad e do PT. No voto, Bellizze destacou que a Justiça Eleitoral do Rio de Janeiro já havia determinado a retirada dos conteúdos, publicados em mais de uma conta nas redes sociais, e que não havia os requisitos necessários para ensejar a indenização na esfera cível – como conduta danosa e nexo de casualidade.
Bellizze também afirmou que, nos autos, há provas de que o vídeo não foi elaborado pelo então presidenciável nem pela sigla, que desconheciam o conteúdo. “Ao contrário do que entendeu a corte de origem, não se pode imputar responsabilidade a um partido ou candidato por violação a direito autoral perpetrada por seus eleitores ou simpatizantes”, disse o relator, durante a sessão de julgamento desta terça-feira (14).
O ministro argumentou que o código eleitoral tem uma previsão específica para a retirada de circulação da obra de um artista e que isso não é suficiente para imputar responsabilidade civil. Acrescentou que a remoção do conteúdo basta para garantir a desvinculação da cantora à campanha eleitoral e não afete sua honra ou reputação.
Bellizze disse ainda que “não se pode impor aos partidos e candidatos a responsabilidade de controlar o debate político travado pelos eleitores”, “sobretudo no ambiente virtual”. Sugeriu que Paula Toller movesse uma ação contra os reais causadores dos danos, sem imputar responsabilidade solidária de Haddad ou do PT.
Bellizze foi acompanhado por todos os outros ministros da 3ª Turma – Nancy Andrighi, Ricardo Villas Bôas Cueva, Moura Ribeiro e Humberto Martins.
Na decisão anterior, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) havia afirmado que uso indevido da obra se justificava pela falta de autorização prévia da artista. Como não houve a autorização, houve “violação a seu direito de personalidade, tanto como autora quanto como intérprete, o que configura danos a seus direitos de imagem e enseja a reparação”.
Segundo decisão da 4ª Turma Cível, Haddad e o PT “obtiveram vantagem, com a divulgação midiática em apreço” dos vídeos e que “as circunstâncias e peculiaridades do caso concreto revelam a impossibilidade de o partido e ou candidato não possuir prévio conhecimento a respeito da existência da propaganda”.
Em nota divulgada à imprensa, os advogados Angelo Ferraro e Miguel Novaes, do escritório Ferraro, Rocha e Novaes Advogados, que representam o PT e Haddad, disseram que o acórdão do TJDFT fez a condenação “com base em fundamentos equivocados”. “Há clara ausência de responsabilidade solidária do candidato e do partido político por ato praticado por terceiros pois nenhum dos links ou conteúdos em que o trecho da obra de Paula Toller foi usado foram exibidos em canais oficiais de campanha”, diz Angelo Ferraro.
O advogado Pedro Tinoco, especialista em propriedade intelectual e sócio do Almeida Advogados, diz que um dos principais critérios para a fixação de indenização é avaliar o nexo de causalidade. “Seria preciso demonstrar a relação objetiva entre o conteúdo que viola os direitos autorais com alguma ação da campanha”, afirma.
Segundo a advogada Vitoria Rodrigues dos Santos, do Peluso, Stupp e Guaritá Advogados, deve ser avaliado a extensão do dano. Com a retirada do vídeo pela Justiça Eleitoral, se interrompe o uso indevido da imagem e música da artista. “Quanto maior o alcance, maior deverá ser a indenização para reparar a propagação do vídeo com tal conteúdo. Por isso, a retirada do vídeo ganha valor jurídico para fins de análise do dano”, diz.
Procurado, Fernando Haddad informou por meio de sua assessoria de imprensa que não irá comentar a decisão. O PT disse o mesmo, assim como o advogado da cantora no STJ, Allan Sergio Reis.